Qual o momento exato em que ultrapassamos a linha tênue entre a atração, física e/ou intelectivo e a paixão? Sim, por que num pequeno intervalo de tempo, num átimo de segundo, nos apaixonamos.
De repente aquele sorriso, aquele cândito e simplório sorriso já não sai mais da sua mente. Fica ele perambulando defronte a seus olhos, inebriado pelo hálito fresco e excitante que flui de sua boca. E os lábios? Ah, porque lábios tão rubros? Lábios perfeitamente delineados, perfeitamente adaptados à volúpia dos meus próprios. Só um beijo falaria as palavras que me faltam.
Subitamente aqueles olhos, deliciosos olhos castanhos esverdeados adquirem todas as cores mais belas do mundo. O que os faz tão penetrantes assim? Se numa única mira são capazes de me eriçar, de me embaralhar, ferver-me inteiro por dentro para depois cristalizar meu coração sob minha garganta. Olhos de águia, que me despem, me caçam, me arrebatam tão violentamente que tudo o que mais desejo fazer é permanecer olhando-os para toda a eternidade. O brilho desses olhos que me faz salivar, o resplendor dessa miragem que me apunhá-la.
De súbito passo a sentir seu cheiro em todos os cantos, a procurar por ele. Delongo um abraço para ficar mais tempo agarrado ao teu cangote, me embriagando da essência que mana de minha paixão. Brinco com meus sentidos, divirto-me com minha imaginação, devaneando se aquele é o mesmo cheiro que exala em todo o seu corpo.
Repentinamente seu toque me enternece, me causa sensações que eu jamais pude imaginar serem tão deleitosas. Tangencio o seu braço cautelosamente, fecho os olhos para lograr da emoção. Meus pêlos se arrepiam se em contato com os seus, denunciando minha abrupta excitação em ter-te perto de mim.
De repente seu contexto passa a ser primoroso. Suas palavras são católicas, religiosas, munidas de uma sabedoria que nem os profetas são capazes de imbuir-se. Escuto-te por horas, sorvendo cada timbre de sua voz, cada sílaba não dita e todos os cacoetes que fazem de seu discurso algo tão singular.
Tudo, absolutamente tudo em você me atrai. Até os seus defeitos, até seus desarranjos eu intento em minha vida, cotidianamente, dia após dia. A partir daí não é mais uma simples atração. Já é paixão. Paixão árdega e abrasante, que não me deixa pensar, que não me deixar dormir, que não me deixa imaginar outra coisa senão experimentar a existência ao seu lado. Disso eu sei, só não sei quando aconteceu.
quinta-feira, 22 de novembro de 2012
Repentinamente
segunda-feira, 19 de novembro de 2012
Tudo passa
A verdade é que tudo passa. Passa amor, passa dor, passa tempo, tudo passa. Sentimentos mudam, flores murcham, cores desbotam, tudo se desgasta, tudo perde o brilho, tudo passa. O vento corre, o ar lhe falta, a luz se apaga, o cheiro escassa, tudo, tudo passa. O toque é rápido, o olhar desviado, o beijo resseca, o sexo esfria, tudo se frustra, tudo diminui, tudo passa. O eterno acaba, a música pára, o sono vai embora, a memória falha, o dinheiro se esgota, tudo se finda, tudo se esfarela, tudo passa. O sonho se dissipa, a estação se modifica, o sol de põe, você envelhece, tudo desencarna, tudo falece. Tudo, absolutamente tudo passa.
domingo, 18 de novembro de 2012
Meueuemmim
Se somos quem queremos ser, quando escolhi ser eu? Quando meu ser se elegeu meu, quando designei meus predicados e, afinal de contas, quando preguei cada feitio, cada virtude e cada desconcerto na figura que viria a ser eu?
Quando abdiquei de um sorriso perfeito, de belos e delgados dentes cândidos e imáculos, para optar pelo meu singelo e amarelado riso envergonhado? Quando, me responda, troquei os belos fios alisados, macios e ensolarados, por madeixas tão enfurecidas, cabelos cacheados-sem-ver-pente? Em que ocasião desisti de ter um belo e universal torso robusto e atraente, para me conformar com o desjeito e insólito corpo que é meu?
Se somos quem intencionamos, por que sou tão inconstante? Por que meu humor ora fere a mim e aos que me rodeiam, chicoteia, rasga lágrimas, e outrora rompe sorrisos, emoções verdadeiras, amor? Por que sou só bom em certas coisas e não em tudo? Por que, por favor, responda-me, meu caráter é tão genioso, capaz de virar as costas para o díspar e ao que é desarmônico do resto de mim? E porque, meu Deus, por que essa sensação constante de estar mutilado, desejoso de algo que me falta, de algo que, por vezes, nem me dou conta que existe?
A verdade é que, se somos quem não queremos ser, podemos escolher ser alguém diferente, só não podemos nos desprender de nossa essência, do fiapo d'alma que nos torna singular, que nos torna único. Odeio meus desarranjos mais do que tudo na vida, por que, talvez, eles representem os meus maiores fracassos visíveis a olho nu, mas, no fundo, também os amo. São meus defeitos que moldam minhas qualidades, esculpem com equilíbrio quem eu sou ou deixo de ser.
Se eu não fosse exatamente como sou agora, não teria passado pelas mesmas provações, vencido os tantos obstáculos que me foram designados, cativado os amigos que me cercam e os que desejam estar comigo e que nem me dou conta. Sou ser humano, sinônimo claro de imperfeição. Somos ciclos, seja na idade, seja na pessoalidade. Aquilo que me era adjetivo antes, hoje pode já não me servir mais, ter-se esquecido no fundo do armário, criado teia. Os desregramentos que me incomodam hoje não me incomodarão amanhã, e serão apagados.
Agora eu pergunto: Por que?
A resposta é simples. Se somos quem seremos ser, sou quem sou e nem me lembro do que era antes. Sou o presente de mim, primogênito do meu passado e progenitor do que de mim estar por vir. Sim, sou quem eu quero ser porque escolhi ser assim, e quando o meu eu não me for mais benquisto, não o serei mais.
No fim das contas não trocaria meu sorriso amarelado, meus cabelos revoltosos e encaracolados, meu corpo débil e desengonçado, meu temperamento estriduloso e nem meu gênio indomável por nada desse mundo.
Eles são eu, e eu sou eles. E você, quem é?
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